quarta-feira, 7 de abril de 2010

Apoiando Demóstenes Torres e o No race.


Fui cotista. Ingressei na Universidade do Estado do Rio de Janeiro em abril de 2004. Àquela época, todo universitário que ingressava pelo sistema de cotas era de pronto beneficiado por uma bolsa de seis meses, que sempre era renovada por mais seis. Durante este um ano ficamos literalmente “mamando nas tetas do governo”, uma vaca premiada! Recebíamos míseros R$ 190,00 mensais, e não precisávamos fazer nada para justificá-los, enquanto quaisquer outros alunos não-cotistas e também bolsistas trabalhavam as suas 20h semanais, prestavam conta de sua produção científica em relatórios e recebiam os mesmo valor. Aí me pego pensando: será que esta é mais uma prática de reparação? Será que por ter antepassados afrodescendentes escravizados pelos eurodescendentes, eles querem agora que a galera da melanina acentuada não precise trabalhar pra receber enquanto os“branquelos” vão pro eito? Isto já era um absurdo no início, mas a coisa foi piorando. Já quando estava prestes a me formar - faltando quase um ano - um amigo me disse que meu nome estava numa lista para receber uma bolsa de incentivo à graduação (BIG), paga pela FAPERJ. Achei muito estranho que selecionassem uma formanda, bolsista de iniciação cientifica do CNPq, que já recebera ajuda de custo por ser cotista durante o primeiro ano de faculdade, para ainda receber uma bolsa da FAPERJ. Desta vez eu teria que trabalhar, mas o absurdo ainda estava por vir. O negócio era o seguinte, parece que daqui para frente, para ser bolsista seria necessário ser cotista. Cada professor teria direito a três bolsas BIG, no valor de R$214,00, que só poderiam ser concedidas a cotistas. Isto é um absurdo. Bolsa sempre foi uma questão de merecimento, talento, mas passou a ser esmola. E muitos cotistas - os inteligentes, esforçados, merecedores – já são bolsistas de projetos de professores há tempos (o que, modéstia à parte, foi o meu caso). Como não se pode acumular bolsas, o que tem acontecido é que não se conseguem cotistas o suficiente para preencher as vagas de bolsas BIG oferecidas. Por outro lado, alunos não-cotistas que moram distante, que não têm emprego, que vêm de famílias pobres, que precisam muito de míseros R$214,00, não podem preencher as vagas ociosas dos cotistas. Isto é racismo, é irascível, é cruel. Eu fui cotista porque descendo de negros (por parte de pai, o que inclui aquela minha tia Doralice que queria limpar a barriga das filhas), mas ninguém levou em consideração os meus bisavós portugueses (por parte de mãe). Todos nós somos meio africanos, meio europeus, meio indígenas, e por aí vai. Sou cotista, mas não vão me tornar racista, nazista. Estou aqui tomando as dores dos brasileiros de todas as cores que entram legitimamente numa universidade pública estadual e mesmo merecendo têm o seu direito à recompensa de seu talento negado por uma cambada de idiotas racistas que, infelizmente, estão mandando neste país.

Um comentário:

Branquinha disse...

Eu não sou a favor de cotas, sou de uma família totalmente miscigenda (e duvido muito que exista alguma famíli apuro-sangue no Brasil), sou branquela e estudei a minha vida inteira em escola pública, assim como meus irmãos, não poderia jamais ser cotista pela cor da minha pele...
Não sou e nunca fui preconceituosa, e acredito sim que a maior causa de excluão não se dá pela raça e sim pela condição sócio-econômica.
Seu texto (como sempre) foi primoroso ao tratar do assunto...
Abraço